Semeadores

domingo, 18 de setembro de 2011

ESTRATÉGIAS

  • Promover o desenvolvimento e fortalecimento de lideranças locais, a partir do envolvimento de pessoas, grupos e organizações sociais existentes, compartilhando instrumentais de conhecimento e intervenção social na realidade, tendo a capacitação como um elemento motivador para envolver os jovens como protagonistas de mudança;
  • Condução e gerenciamento interno no projeto, que garantam a participação e a gestão de forma colegiada, com avaliação permanente de processos, impactos e resultados, socializando a experiência para o fortalecimento do fórum e das entidades e grupos que o compõem buscando alternativas de sustentabilidade;
  • Opção pela organização em redes, construção de parcerias e trabalho coletivo na elaboração da visão, planejamento, construção, gestão, sistematização e avaliação da Associação de Empreendedores Sociais SEMEAR, como estratégia de sustentabilidade e fortalecimento da SEMEAR e de uma nova cultura de desenvolvimento de projetos sociais;
  • Articular atividades de capacitação contínua sobre as temáticas: Promoção da Saúde e Qualidade de Vida, Desenvolvimento Local Integrado Sustentável, Meio Ambiente e Saúde, Cidadania e Direitos Humanos, Participação Social, Protagonismo Ativo e Empoderamento, Comunicação, Educação, Arte e Cultura, capacitação profissional e mercado de trabalho junto aos jovens e grupos da comunidade;
  • Ter na Educação, Comunicação, Arte e Cultura, elementos motivadores, mobilizadores e integradores dos jovens na construção e fortalecimento das identidades individuais e coletivas e na elevação da auto-estima, promovendo o acesso aos meios e a democratização da informação.
  • Envolvimento da UFRN e outras instituições de ensino em atividades de pesquisa científica, ensino e extensão universitária;
  • Promover a aproximação e o envolvimento das organizações governamentais e setores empresariais com as demandas e anseios da comunidade, possibilitando a formulação e implementação de Políticas Públicas referenciadas no Projeto de Desenvolvimento Local Sustentável formulado coletivamente.

DESENVOLVIMENTO LOCAL INTEGRADO E SUSTENTÁVEL

A questão da sustentabilidade não remete meramente a conservação da natureza e à administração de ecossistemas, em uma concepção mais ampla, aponta para novos modelos de desenvolvimento e para transformações sociais. Sendo assim é preciso trazer a discussão da sustentabilidade para o campo das relações sociais.

A conservação dos recursos naturais deve estar, portanto, articulado com outros objetivos, entre eles o enfrentamento da pobreza, a equidade, a justiça social, a democracia, a garantia de organização social, dos direitos trabalhistas, a um ambiente saudável e ao bem-estar geral. Requisitos mínimos para o exercício e o fortalecimento da cidadania e parte inseparável do processo do desenvolvimento.

Por desenvolvimento local integrado e sustentável estamos considerando o conceito apresentado por Augusto de Franco (1998) , por ele apontado com resultado de um amplo debate entre organizações não governamentais, de governo e organismos internacionais:

"Desenvolvimento local integrado e sustentável é um novo modo de promover o desenvolvimento que possibilita o surgimento de comunidades mais sustentáveis, capazes de suprir suas necessidades imediatas, descobrir ou despertar suas vocações locais e desenvolver suas potencialidades específicas além de fomentar o intercâmbio externo, aproveitando-se de suas vantagens locais."

É importante ressaltar que o conceito de sustentabilidade é um princípio em construção, sobre o qual não existe uma hegemonia de pensamento. Cabe à sociedade a responsabilidade de construir um desenvolvimento sustentável assim como de criar condições para que amplos setores e atores sociais participem dessa construção, considerando as realidades ecológicas e socioculturais locais.

Segundo Joachim H. Spangenberg , a sustentabilidade não pode ocorrer de forma isolada a um país, região ou área circunscrita, tendo em vista a realidade de um mundo interligado em termos econômicos e comunicativos, ao mesmo tempo é preciso reconhecer a necessidade de cada região enfrentar de forma autônoma seus dilemas e perspectivas em relação ao futuro, construindo modelos próprios. Cabe às comunidades locais, enquanto atores sociais plenamente capazes, formular sobre seu próprio desenvolvimento.

A cidade, enquanto uma das dimensões desse local precisa considerar componentes não mercantis na discussão da sustentabilidade e deve ser entendida como "espaço de qualidade de vida". Como um espaço de exercício da cidadania ativa e de expressão das identidades, valores e heranças, que são construídos ao longo do tempo e não apenas enquanto espaço de produção de riqueza. Considerar esses fatores possibilita o fortalecimento do sentimento de pertencimento dos habitantes a suas cidades. Isso é particularmente importante quando se pensa em envolver a juventude em uma estratégia de enfrentamento da pobreza, priorizando o espaço local, tal qual apresentado nesta proposta.

A noção de desenvolvimento sustentável passa por diversas matrizes discursivas, algumas, com foco nas bases técnico materiais outras têm como pressuposto o espaço das cidades pensado em razões de "qualidade de vida". Esta última opção pressupõe uma abordagem inter e trans-disciplinar e a adoção de valores éticos como orientadores da ação política.

Sobre esta questão, o Projeto Brasil Sustentável e Democrático assim define o espaço das cidades neste contexto:

(...) Mas pensar a cidade é também pensar o bairro, o espaço do quotidiano, da convivência. É necessário pensar as formas de construção/reconstrução do tecido social através do lazer, da cultura, do enfrentamento dos problemas locais, como forma de resistência e embrião de uma nova cidade, espaço de exercício da cidadania e lugar de experimentação e aprendizado para o enfrentamento das questões no espaço da metrópole." 

Uma das causas da insustentabilidade é o desequilíbrio entre as necessidades cotidianas da população e os meios de as satisfazer, que por sua vez, passa pela incapacidade das políticas urbanas adaptarem a oferta de serviços às demandas sociais, pela ausência de mecanismos distributivos desses serviços.

Construir outras vias e saídas para a superação da exclusão, miséria e desigualdade social passa pelo empoderamento das pessoas e comunidades aumentando assim sua capacidade de interlocução com as instituições públicas e privadas visando a captação de recursos e investimentos de diversas ordens.

O empoderamento, por sua vez, pressupõe a educação e capacitação técnica e política para o desenvolvimento, a constituição de novas bases de informação, com a produção e socialização de indicadores locais de desenvolvimento, que incorporem índices de qualidade de vida e de desenvolvimento humano. Precisa também da aplicação de estratégias eficientes de comunicação e marketing social que possibilite um fluxo permanente de informações, o despertar para as possibilidades e vantagens de um processo de desenvolvimento mais solidário e ético.

PROMOÇÃO DA SAÚDE E CIDADE SAUDÁVEL

A construção das bases para um modelo de promoção da saúde na Região Oeste e em toda Natal é um desafio que vai muito além da prevenção e do combate de doenças. Além de reduzir os índices de doença e de morte, é preciso trabalhar para a melhoria da qualidade de vida e diminuição da desigualdade social.

Promoção da Saúde não trata apenas de indivíduos, ou de grupos de riscos, ou campanhas de vacinação, ela se refere à cidadania.

Não se refere ao consumo de atos médicos ou de enfermagem, mas ao consumo de serviços de saúde, ao cliente-cidadão na perspectiva de incluir-se dentro do consumo de saúde. Ela se refere à saúde como um direito, tal qual está na Constituição Federal , não como um benefício ou uma concessão do Estado. Neste sentido o modelo da Promoção da Saúde se fundamenta no princípio de constituição de um modelo que defende a vida.

Não interessa apenas reduzir mortalidade infantil, mas garantir as condições necessárias para que estas crianças, que não morreram no primeiro ano de vida, vivam com dignidade. Que lhes sejam garantidas as condições para seu desenvolvimento mental e intelectual, físico e social. Para tanto é necessário que haja oportunidades de desenvolvimento, de emprego, de renda, de escola e de moradia.


Saúde como defesa e qualidade de vida, aponta para uma ação intersetorial. Apresenta a necessidade de somar com a sociedade.


A população e os jovens, a Universidade, organismos governamentais e não governamentais e outros segmentos, que engrossaram essa luta que em última instância é uma luta pelo fim da exclusão social.


O movimento pela saúde concebida como defesa da vida vem denunciando que o modelo de atenção atual - centrado na doença, na atuação individual e do hospital - é limitado e já apresenta sinais de esgotamento. A conquista da saúde é o resultado de um conjunto de ações intersetoriais: de promoção social, educação, segurança pública, infra-estrutura urbana. Envolve além dos profissionais do setor saúde a sociedade, o Ministério Público, a Câmara de Vereadores, a Assembléia Legislativa, os governos municipal, estadual e federal, o empresariado. É um esforço coletivo de CONSTRUÇÃO de uma saúde coletiva. Nesse esforço de construção não falamos de igualdade, mas de equidade. O médico e ex-secretário de saúde da cidade de Santos-SP, Davi.
Capistrano, assim descreve esta luta:

"Vejo nosso trabalho, enquanto dirigentes municipais de saúde, como uma guerra. Uma guerra contra as consequências, no campo da saúde, da miséria, da fome, da ignorância, dos ambientes de trabalho insalubres e inseguros, de toda uma forma de organização social violenta, cruel geradora de desigualdades. Numa palavra, nós travamos uma guerra em defesa da saúde e da vida, contra o rastro de sofrimento e de morte com o qual o capitalismo brasileiro marca a existência de milhões de pessoas".

Dentre as concepções e objetivos para se pensar saúde e organizar uma intervenção nos serviços do setor está a construção de "Cidades Saudáveis". A concepção de Cidade Saudável tem sua origem nas preocupações do Movimento Sanitário do final do século 19, na Inglaterra e ressurge, com práticas modernas e participação popular a partir da Carta de Otawa elaborada na Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde que ocorreu em novembro de l986. Esse documento define Promoção da Saúde como um "processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da qualidade de vida e saúde incluindo uma maior participação no controle desse processo" .

Segundo essa primeira Conferência os objetivos de uma política de promoção são: estabelecer políticas públicas saudáveis (cidades saudáveis); criar ambientes saudáveis para saúde como praças, logradouros, ruas, aterro sanitário e saneamento básico; reforçar a ação comunitária; desenvolver atitudes pessoais e habilidades individuais. Quer dizer, investir nas pessoas, no capital humano, elas é quem fazem a transformação.
A promoção da saúde é constituída por processos que experimentam uma outra lógica que não é a da verticalização. É a lógica da ação horizontal e intersetorial. Esse é um desafio a ser vencido, cujo processo passa pela reorganização completa e radical dos modos de intervenção nos serviços de saúde e por uma cultura da saúde e da própria sociedade, porque ninguém vai fazer mudanças na saúde se não for com o fortalecimento do controle social num processo que envolve toda a sociedade.

Além da conferência de Otawa outras se seguiram reafirmando e aprimorando o conceito de promoção da saúde e recomendando ações para sua efetivação. Outro evento importante foi a ECO-92, que aconteceu no Rio de Janeiro, do qual foi elaborada a Agenda 21, uma agenda estratégica na qual discutiu-se o desenvolvimento sustentado para cidade saudável, políticas de educação, de trabalho, de geração de renda, habitação, segurança e meio ambiente. A adoção dessa agenda é importante como uma etapa, do processo pelo conjunto de forças sociais que defendem mudanças nas políticas sociais.

A concepção de Cidade saudável deve articular a construção de uma sociedade baseada no princípio do desenvolvimento humano, cujo fundamento real é o universalismo do direito à vida. Sustentabilidade da vida, da sociedade, da economia, da cultura.

Para tanto, faz-se necessário trabalhar pela constituição de sujeitos sociais comprometidos com o campo da saúde como luta política, sensibilizando administradores municipais, empresários e as pessoas em geral para a importância da adoção de iniciativas intersetoriais. Contribuindo para mudança cultural das práticas sanitárias e para a construção de sistemas de saúde dentro desses novos conceitos e visão.

Estimular a organização popular visando ampliar o poder da população, o poder local da população para a vigilância e intervenção nas políticas públicas é condição essencial para que as pessoas possam ampliar sua capacidade de participar de forma qualificada, aumentando o poder de vigilância e de ação política da população.

DEMOCRATIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO CONTRA A EXCLUSÃO TECNOLÓGICA

Tivemos, nas duas últimas décadas, uma verdadeira revolução tecnológica, que modificou de forma profunda as relações sociais e econômicas do planeta. Ao mesmo tempo em que ingressamos no século XXI, com grandes avanços científicos e tecnológicos, temos ainda 1/3 da população mundial vivendo na pobreza: milhões de famintos, analfabetos, desempregados, sem terra, sem teto. Excluídos da chamada "Aldeia Global".

Esta muralha que separa a pobreza ainda existente do século XIV e o avanço tecnológico do século XXI aumenta ainda mais as responsabilidades dos setores populares em se contraporem à exclusão tecnológica e à manipulação da mídia, da informação e do conhecimento por parte dos grupos dominantes. O desenvolvimento tecnológico e científico deve estar direcionado para o desenvolvimento humano, para atender as necessidades humanas.

A luta pela democratização dos meios de comunicação passa não apenas pelo acesso a estes meios, mas pela construção de novas formas de utilização com vistas a transforma-los em ferramentas de construção de valores éticos e humanos assumindo seu papel estratégico de formar, informar e disseminar conhecimento.

Trata-se, ainda, por possibilitar às pessoas desenvolverem suas capacidades para uma leitura crítica da realidade que é apresentada pelos meios de comunicação de massa. Tornando-se também capazes de se contrapor de forma articulada aos valores distorcidos e massificantes que são transmitidos por esses meios. O maior problema que enfrentamos hoje, nesta "sociedade da informação", não está no acesso à informação, mas na maneira como filtramos, processamos e aplicamos essa informação e o conhecimento adquiridos.

Sendo assim, devemos capacitar a comunidade e principalmente os jovens, em várias mídias e linguagens técnicas e artísticas - alternativas e alterativas -, tais como: fotografia, vídeo, rádio, impressos, computadores e internet. Ou seja, promover o domínio, por parte dos jovens, dessas tecnologias, enquanto uma ferramenta de empoderamento com vistas a construir uma sociedade socialmente justa. Formar comunicadores populares jovens comprometidos com a disseminação desses princípios entre eles mesmos e em suas comunidades, possibilitando ao mesmo tempo uma abertura para o mundo e um olhar para sua identidade. A globalização e a sociedade planetária devem ser construídas com base no respeito à identidade e cultura do local e do particular.
A exclusão tecnológica deve ser combatida não apenas através da instalação de computadores ou da garantia do acesso à internet. Mas a partir da construção de uma nova visão das novas tecnologias e da comunicação. É preciso articular nossas ações e transformar estas máquinas em ferramentas de cidadania, se contrapondo ao "monopólio da fala", à censura e à visão mercadológica excludente hoje presente nos meios de comunicação de massa.

Qualquer estratégia de combate à pobreza, passa necessariamente pela garantia aos jovens do acesso à tecnologia, à informação e ao conhecimento e ao domínio de habilidades para utilizá-las em seu próprio benefício.

CIDADANIA ATIVA PARA UMA NOVA SOCIEDADE

Para abordarmos a noção de cidadania é preciso considerar as várias formas que este conceito vem assumindo no decorrer da história em função dos diversos contextos culturais. É preciso, também, considerar a evolução do pensamento filosófico, social e político da humanidade.

Nessa perspectiva Liszt Vieira parte da idéia de cidadania ser o direito a ter direitos. Segundo Vieira a concepção que se tornou clássica é compreendida a partir da teoria liberal que fundamenta seu pensamento nos direitos civis e políticos, definidos como direitos de primeira geração.

No entanto, é possível identificar alguns equívocos nesta concepção. Primeiro, nem todos os indivíduos são considerados cidadãos, apenas aqueles que política e economicamente participam das atividades do Estado. Segundo, limitar o exercício da cidadania aos princípios civis e políticos, como era no Estado Liberal, significava restringir o cidadão ao exercício do voto.

As críticas a esta concepção surgem com a ampliação do conceito incluindo os direitos sociais, considerados direitos de segunda geração. Entre estes direitos sociais está o direito à saúde, educação, trabalho, aposentadoria, etc., que foram conquistados a partir da ascensão dos movimentos sociais, no século XX.
No que diz respeito ainda à evolução de direitos, o século XX é também responsável pelos chamados direitos de terceira geração, ou direitos de solidariedade/fraternidade, que englobam desde o direito a um meio ambiente equilibrado, a uma saudável qualidade de vida, ao progresso, à paz, à autodeterminação dos povos até outros direitos considerados difusos como: direitos do consumidor, das mulheres, das crianças, entre outros. Esses últimos movem os novos movimentos sociais organizados. Atualmente, já se discute uma quarta geração de direitos, que envolve a discussão da bioética e das novas formas de vida.

A cidadania, pois, torna-se produto da história, se considerada a partir do avanço e da conquista de direitos. No século XVIII os direitos civis; no século XIX os políticos; no século XX, os direitos sociais e na segunda metade do século XX, os direitos da coletividade, direitos que têm como titular grupos de indivíduos. A partir dessa compreensão é possível afirmar que a cidadania sendo produto de histórias sociais contextualizadas em determinados períodos é também produto de diferentes grupos sociais.

Cidadania, portanto, configura-se como o conjunto de direitos e liberdades políticas, sociais e econômicas, já estabelecidas ou não por lei. Já o exercício da cidadania é, então, a forma de fazer valer cotidianamente esse conjunto de direitos, é o homem se fazer sujeito de sua própria história.

Nota-se, porém, que a compreensão do conceito é imprescindível para chegarmos a uma compreensão do que atualmente é ser cidadão e que cidadão pretende-se protagonizar. Para ser cidadão é preciso então exigir a observância de seus direitos é zelar para que eles não sejam desrespeitados. Para isso é necessário que se tenha acesso à educação, saúde, identidade cultural, conhecimento, comunicação, participação e organização política e principalmente capacidade crítica para intervir na realidade.

Nesse sentido, a idéia fundamental da cidadania é a transformação social para a conquista de uma sociedade mais justa, igualitária e solidária. E o cidadão seria então, nessa busca pela transformação, aquele que supera a condição de pobreza sócio-econômica e política, tendo noção da posição que ocupa na sociedade e sabendo dos conflitos de poder que existem nela; estará dentro de um processo infindável de conquista de seu próprio espaço, traduzindo o trabalho em colaboração participativa e construindo a cidadania ativa.

A POBREZA E O SEU ENFRENTAMENTO NO PLANO LOCAL

No mundo globalizado a sociedade se transformou num grande balcão de negócios. Um vasto espaço de troca de mercadorias, onde os interesses econômicos de corporações internacionais prevalecem sobre o social, o político, as culturas locais, sobre o próprio direito à vida e ao bem estar.

Essa "sociedade de mercado" regida pela lógica do individualismo e do consumo tenta subverter e restringir a noção de cidadania à inserção no mercado de consumo.


Existem hoje no mundo mais de 800 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza, na América Latina todo ano milhares de crianças morrem de causas evitáveis. Milhares de pessoas ainda não têm água tratada, nem banheiros. No Nordeste do Brasil mais de 45% da população vivem em situação de pobreza.


A política econômica atual orientada pelo projeto neoliberal promove uma abertura comercial absoluta e a mobilidade irrestrita do capital financeiro e produtivo, que destrói as economias locais. Defende a redução do papel do Estado, sem apresentar alternativas de mediação de interesses e conflitos e a flexibilização de direitos trabalhistas e sociais. O Fundo Monetário Internacional, representante dos interesses dos grandes credores internacionais, impõe aos países periféricos, metas socialmente impraticáveis para o pagamento das suas dívidas externas. O que temos é o agravamento da situação de pobreza, o aumento da miséria, da fome, da doença, da exclusão no mundo, com a instalação de uma crise social sem precedentes.


Enfim, já está mais que provado que a redução da pobreza não virá como uma conseqüência natural do aumento da riqueza, mas com a garantia do acesso a bens e serviços, à participação política e pela justiça social.


Os movimentos sociais têm denunciado a perversidade desse modelo e buscado alternativas de reação nos níveis locais, nacionais e internacionais. Nesse contexto as organizações da sociedade civil têm se constituído em um ator político importante, pela sua agilidade em dar respostas, pela capacidade de formulação, pela mobilização social que geram. Um momento recente de articulação internacional foi a primeira reunião do Fórum Social Mundial que ocorreu em Porto Alegre, em janeiro de 2001, no qual mais de 10.000 representantes de organizações não governamentais, partidos políticos, sindicatos, igrejas, etc, discutiram alternativas de combate à pobreza e de inclusão social.


Com o reconhecimento público, por parte do Banco Mundial e do FMI, da responsabilidade dessa política neoliberal pelo aumento da pobreza no mundo, estas e outras instituições têm incluído em suas pautas a necessidade de investimentos sociais para o combate à pobreza. Porém, continuam por manter a mesma política de desenvolvimento baseada apenas no mito do crescimento econômico.


No Brasil, os dados recentes relativos à pobreza, desigualdade social e crescimento econômico mostram o fracasso no combate à pobreza e da política econômica do governo federal baseada nesse modelo. Para a erradicação da pobreza é preciso implantar uma política econômica que seja guiada por uma agenda social.
Apesar de muitas das causas da pobreza serem determinadas pela macro-economia, sua superação não é tarefa apenas dos órgãos governamentais ou dos partidos políticos; é um desafio e uma responsabilidade de toda a sociedade, de todo cidadão. Não depende só do capital financeiro, mas do investimento em outros capitais: humanos, naturais, institucionais, políticos, cognitivos, culturais etc, que precisam ser identificados e potencializados no âmbito local. Nas cidades, nos bairros, nas comunidades rurais, dentre outros.

Pressupõe o envolvimento das pessoas em um amplo processo de mobilização e organização social, para o qual devemos considerar e aproveitar a energia direta dos jovens, no enfrentamento dos seus problemas e de sua comunidade, bem como na construção de uma nova sociedade, que será sua herança num futuro muito próximo. O impacto negativo da pobreza sobre os jovens é provavelmente o mais grave, pois interrompe seu processo de crescimento e condena as gerações futuras à pobreza e à morte.

A mobilização da energia popular deve se dar no sentido de buscar novas formas de ver os problemas de cada comunidade e construir com elas os caminhos de solução. Essas soluções devem ser simples, possíveis de ser compreendidas, aceitas e executadas pelos jovens e suas respectivas comunidades.

A mão de obra ociosa pelo desemprego pode ser aproveitada em ações e estratégias que gerem mudanças na paisagem e melhoria da qualidade de vida das comunidades. Empregar para produzir bens e serviços sociais é uma lógica comprometida com resultados sociais, realizando uma dinâmica includente, ética e sustentável.

A solução de problemas emergenciais no nível local, melhora a vida das pessoas, fazendo-as perceber que são capazes e co-responsáveis pela solução dos seus problemas. Aumenta a auto-estima, o autoconceito e a autoconfiança nas suas próprias habilidades, trazendo esperança e fé.

Além da mobilização do capital humano, o investimento em outros capitais se faz necessário. A questão da geração de trabalho e renda constitui-se em uma questão complexa que pressupõe a articulação de muitos fatores para de fato se obter sucesso.

Qualquer estratégia a ser implementada pelo terceiro setor deverá estabelecer parcerias com as instituições de governo locais, que possuem condições e recursos para o estabelecimento de políticas públicas que possam impactar positivamente sobre a questão do desemprego e da pobreza.

A educação é uma das medidas de maior impacto contra a pobreza, pois assim poderá evitar que os jovens de hoje sejam adultos pobres no futuro.

CARTA DE PRÍNCIPIOS


  • Construir novas vias e saídas para superação da pobreza, exclusão e desigualdade social pelo desenvolvimento local integrado, sustentável e democrático, influenciando na elaboração de políticas públicas includentes;
  • Entender o combate à pobreza na perspectiva da defesa e promoção dos direitos humanos integrais - econômicos, sociais, políticos e culturais - e do compromisso com a construção de uma Cidadania Ativa;
  • Promover o protagonismo juvenil e o empoderamento com vistas à construção de projetos de vida e de transformação social (individuais e coletivos);
  • Desenvolver o trabalho em rede e a parceria, a partir da construção de espaços e relações solidárias e democráticas de convivência, com vistas à sustentabilidade e multiplicação da Asociação de Empreendedores Sociais SEMEAR;
  • Defender a democracia, a liberdade de expressão, o acesso ao conhecimento e aos meios de comunicação;
  • Promover a arte e a cultura como elemento de construção de identidades, mobilização e fortalecimento da ação comunitária;
  • Mudar a paisagem da região, física e socialmente, com vistas a melhoria da qualidade de vida e a preservação do meio ambiente.

EMPODERAMENTO E PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA

A realidade é construída a partir da existência das coisas, da difusão de idéias, da criação de opinião, do sentido que o homem dar a sua existência; é a construção da vida cotidiana que constitui a realidade social. As relações que se estabelecem na sociedade são relações de poder, e, o poder, é exercido em diversas esferas através da capacidade de agir para alcançar objetivos e interesses que dão sentido à existência humana. Nessa perspectiva o poder se caracteriza enquanto um fenômeno social que é estabelecido tanto por instituições, como pelas relações entre os indivíduos em seu cotidiano.


Para exercer o poder os homens utilizam-se de diversos recursos, ou seja, meios que possibilitem alcançar interesses e objetivos que dêem sentido a sua existência. Há, portanto, uma relação direta entre os recursos que acumulam e o aumento do poder. O tipo de recurso varia de acordo com a forma de poder exercido. O poder econômico, por exemplo, exige dos indivíduos o acúmulo de recursos materiais e financeiros. Já o poder político o recurso que o determina é a autoridade, cuja maior expressão, em nossa sociedade, é o Estado. Há ainda os poderes coercitivo e o simbólico. O primeiro, como o próprio termo explica, refere-se a coerção, cujo recurso é a aplicação da força. Por fim o poder simbólico, esse mais complexo, pois, se apresenta como característica fundamental da vida social, articulado a partir das interações comunicacionais de indivíduos e grupos. A compreensão, a clareza e o domínio deste poder podem levar os indivíduos a intervir no curso dos acontecimentos. 


Esses poderes se articulam e se interelacionam de diversas formas e níveis. Mas essas relações são, em grande medida, determinadas pelos interesses econômicos vigentes e pelos diversos modos de produzir riqueza.

Os indivíduos encontram-se diariamente em atividades de expressão de si mesmos ou interpretando expressões utilizadas por outros. É na interação com os outros que há troca de informação com conteúdos simbólicos. A comunicação e o conhecimento são elementos essenciais para que o indivíduo (o jovem) tenha condição de tomar alguma decisão e agir em seu próprio benefício e de sua comunidade, sejam, portanto, empoderados.

O empoderamento acontece na medida em que se conquista e se distribui entre muitos o poder de realizar ações. Porém não é a mera realização de tarefas que define o empoderamento e sim a ação conectada a um senso de responsabilidade pelo trabalho, pela aquisição de conhecimento e pela capacidade de produzir mudanças a partir dele.

O empoderamento, então, serve como um propósito para atender objetivos. Neste projeto, fornecerá aos jovens trabalhos significativos que dêem sentido a sua realização, ajudando-os a organizar o trabalho e a organizar a si mesmos.

Numa visão sociológica são três os componentes importantes no empoderamento: entender-se a si próprio em relação ao contexto no qual se opera, significa entender como os objetivos dos jovens estão relacionados com o contexto no qual estão inseridos, poder identificar qual o impacto que esse contexto provoca no comportamento de cada um e como age para estar de acordo com o mesmo. Acredita-se que os jovens serão motivados para provocar mudanças, na medida em que tais mudanças lhe tragam benefícios substanciais para suas vidas.

O segundo componente é entender o contexto e como este opera. É comum não se ter uma visão geral do contexto. Para se obter sucesso no projeto é preciso que os atores envolvidos tenham o conhecimento das partes e do todo.

Por fim, destrezas e habilidades, a conquista de mudanças e incrementos em uma dada realidade e até mesmo na execução do projeto, exige, que os jovens possuam destrezas e habilidades que vão além daquelas tecnicamente necessárias, como por exemplo, processamento em grupo, soluções de problemas, influência e comunicação que possam nos levar a atingir os objetivos pessoais e organizacionais em um contexto complexo.

Conforme a noção de empoderamento aqui trabalhada é possível afirmar que a própria forma como este projeto foi construído, envolveu o empoderamento dos nossos parceiros. Pela divisão de responsabilidades, socialização sistemática de informação e democratização do processo de tomada de decisões. Esse mecanismo se caracteriza como um princípio para se conseguir o empoderamento, ou seja, os "gerentes" precisam também ser emponderados, para que assim possam empoderar os jovens e suas respectivas comunidades.

PROTAGONISMO JUVENIL

A juventude, enquanto objeto de intervenção é um tema instigante. Ser jovem para nossa sociedade sugere, por um lado, esperanças, perspectivas de futuro; por outro suscita preocupação e apreensão quando se observa que boa parte da juventude brasileira encontra-se em condições desfavoráveis e só consegue vislumbrar o resgate de sua liberdade e autonomia através de ações transgressoras e atos de vandalismo que muitas vezes desembocam na violência criminalizada. Isso se agrava mais ainda quando tais ações são fortemente estigmatizadas por órgãos, como a imprensa, que em vez de noticiar os fatos de forma ideologizada, poderia assumir uma postura educativa que contribuísse para uma melhor compreensão da questão .


Uma das contribuições para uma possível mudança nesse quadro seria a possibilidade de ampliação dos espaços de cidadania para esses jovens por parte da imprensa e da sociedade. Os jovens não devem ser identificados apenas por sua precária situação de vida ou por estarem em situação de risco social ou pessoal. Faz-se necessário deixar de ver o jovem como um problema, que atrapalha o desenvolvimento, e vê-lo como uma solução à pobreza e à exclusão. Devem ser vistos como um grande potencial que tem o nosso país e a nossa cidade. Como atores capazes, competentes e ativos. É preciso valorizar a juventude e confiar na sua capacidade de tomar e assumir decisões, responsabilizá-los por coisas importantes, de suas vidas e de sua comunidade.
Através da educação é possível vislumbrar um futuro melhor para os jovens se a concebermos na perspectiva que aponta Garcia que ver "(...) o educando como sujeito da educação (...) [dando] ênfase e destaque ao processo de transformação das pessoas, sua interação dialética com a realidade. É importante que o educando [o jovem] participe, pense, interaja, desenvolvendo suas capacidades intelectuais e consciência social. O educando é sujeito do processo", E aqui acrescentaríamos: é protagonista.

Assim, o protagonismo juvenil é o papel ativo dos jovens em sua educação, no resgate de sua cidadania, exercendo-a em sua comunidade, construindo uma sociedade mais justa e igualitária.

Nesse raciocínio, o que caracteriza e qualifica uma experiência educativa positiva com jovens é a escolha bem sucedida de atividades a serem implementadas com e pelos jovens. Essas atividades dar-se-ão a partir de uma estratégia que pretende investir na educação integral dos jovens. "E educar deve ser compreendido não como um repasse sistemático de conhecimentos assimilados, estáticos e prontos. Educar é facilitar a formação de indivíduos com visão dinâmica, criadora, cultural e humanista, capazes de promover mudanças. É facilitar a interação entre os agentes/atores respeitando-se e desenvolvendo-se conjuntamente como seres humanos, dotados de direitos individuais indisponíveis, e, principalmente, de responsabilidades para com o coletivo.
Educar é apresentar aos outros o seu modelo de conduta, de atitudes e comportamentos. Ninguém ensina o que, realmente, não é, não sente ou não acredita" . Nesse sentido, é preciso estabelecer relações pessoais e uma atenção individualizada nas relações entre o educador e o educando. Esse diálogo individualizado é que fará a diferença, pois, fará os jovens perceberem o quanto são especiais e que nós também percebemos e valorizamos isso.

É nesse tipo de relação mais pessoal que os jovens se sentirão tratados como pessoas e não como mais um entre muitos. Dessa forma, os jovens se abrem, falam de sua vida e de sua família, de seus sentimentos e torna-se possível identificar e trabalhar os talentos de cada um.

A convivência permitirá aos agentes envolvidos no processo, perceberem os 'códigos' que regem as relações do grupo, suas experiências, seus interesses e seus sonhos. Procurando os "interesses" e as "linguagens" que refletem o imaginário dos jovens de hoje do meio popular, que serão nosso principal alvo.

A experiência em comunidades de algumas entidades parceiras deste projeto revela que o acerto na escolha desses caminhos é apontado por diferentes indicadores: a motivação dos jovens em participar; a perseverança; as transformações no comportamento no grupo, na família e na comunidade; fruto de uma auto-valorização dos outros; a abertura para a compreensão dos problemas da comunidade; a vontade e o investimento em melhorar seu próprio desempenho.

A atenção a esses elementos subjetivos do processo educativo e das relações pessoais e sociais estará incorporada e traduzida nas ações e metodologias, pois, a educação aberta que se pretende implementar visa potencializar as diferentes dimensões da personalidade do educando e expressa também a leitura atenta que estes educadores devem fazer das mudanças sociais e das novas exigências (formação polivalente, especialização) que essas mudanças impõem.

Pautarmo-nos nesses princípios implica depararmo-nos com a relação autoridade/liberdade/disciplina. Entendemos que a autoridade dos educadores não será questionada, será aceita e reconhecida quando conquistada pela capacidade dos mesmos de conduzir o processo, e não quando imposta por uma posição de poder hierarquicamente definida. A disciplina aceita será aquela que explicada, definida coletivamente e cuja necessidade pode ser comprovada. Disciplina não deverá ser uma imposição de alguém, mas uma imposição do projeto, do objetivo que o grupo quer atingir. Isso pressupõe necessariamente que o projeto seja do grupo e não de um educador ou de um líder.

Para completar e abrir um pouco mais esta questão da relação entre autoridade/disciplina e liberdade, citamos Paulo Freire: "...tanto quanto possível, seja no campo do adulto quanto no campo dos meninos da criança, o respeito à liberdade e assunção da autoridade para o educador, devem se orientar no sentido de propor ao educando adulto ou não, o exercício de sua capacidade de pensar, criar e ajuizar o exercício de sua capacidade de ler o mundo e de escrever sobre a leitura que faz do mundo. Isto é uma coisa que vem fazendo uma falta enorme na pedagogia brasileira." (Alfabetizar é preciso) - FASE/Itabuna).

HISTÓRIA DO BAIRRO GUARAPES

História do Bairro 
 
As ruínas sob a encosta do morro, as margens da estrada de Macaíba são o que resta da época do poderio econômico do local chamado Guarapes. Do mascate Fabrício Gomes Pedroza, o verdadeiro fundador do bairro, à tão famosa Amélia Machado, a viúva Machado, que se tornou dona daquelas terras, no século XX, foram anos de muita prosperidade. 
 
A história de riqueza de outrora contrasta com as condições atuais dos conjuntos Guarapes I, II e III. Solução governamental para abrigar famílias de baixa renda, a ocupação desordenada no lugar provoca problemas de meio ambiente, particularmente, nos sub-afluentes do rio Jundiaí, que banha o lugar. 

Fabrício Gomes Pedroza, alcunhado no livro "História da Cidade do Natal", de Luís da Câmara Cascudo, como "Senhor dos Guarapes", viu uma colina e encantou-se dela. Nesta colina está a "Casa dos Guarapes", que mais tarde se tornaria famosa por ser o sobrado velho da viúva Machado. 

"Encontrou Guarapes, a colina solitária coberta de árvores, a curva doce do rio, amplo, igual, tranqüilo. Fundou a "Casa dos Guarapes". Em baixo, margeando, a fila dos armazéns bojudos, que tudo guardavam e vendiam. Em cima, os escritórios almoxarifados, a Capela, a escola, o quartel-general da ação", relata Cascudo. 

Quando fala sobre a parte baixa, Cascudo refere-se à área onde estão as granjas hoje, na margem direita da estrada de Macaíba, sentido Natal/interior. Ali, bem em frente as ruínas, o local foi aterrado para funcionar como um ancoradouro. Este era o ponto comercial intermediário da cidade. "De 1869 a 1870, mais de vinte navios vêm, em viagem direta, da Europa a Guarapes, carregar", relata Cascudo. 

O negócio de Fabrício foi continuado pelo genro Amaro Barreto e pelo segundo Fabrício Gomes Pedroza. 

Cascudo lembra que o negócio, já transferido para Natal, permaneceu até 1890, "com força decisiva na praça."
Muito antes de Fabrício Gomes Pedroza, o auto de repartição de terras do Rio Grande, de 1614, existe referência ao rio de Guaramine. Apesar da grafia, o nome Guarapes não surgiu daí. Possivelmente, o topônimo lembra, de forma abreviada, o nome dos montes nos arredores de Recife, onde ocorreram as grandes batalhas na luta pela expulsão dos invasores holandeses. Dizem também que é originária da casa do major Fabrício Pedroza. 

A estrada de Macaíba, chamada também de rodagem do Seridó, foi iniciada por Brandão Cavalcanti, em 1914. Mais tarde, entre 1921 e 1922, o trecho entre Macaíba e a capital foi completado por Eduardo Parisot. A famosa ponte de Guarapes, parte integrante do quadro de divisão territorial do Estado, foi marco da divisa entre Natal e Macaíba. Esta ponte era de madeira, sendo refeita em alvenaria por Júlio de Melo Rezende, entre 1924 e 1925, quando este era da inspetoria das secas. 

Mistérios rondam o sobrado da viúva Machado 

Ana Batista Conceição, trabalhava zelando o sobrado da viúva Machado. Depois de casar com Francisco de Mônica, ela foi morar, em 1915, na histórica casa da colina dos Guarapes. O marido dela era vigia da imensidão de terras da família Machado. 

Muitos garotos cresceram com medo da viúva Machado. Os pais costumavam dizer que ela viria pegar quem não andasse na linha. O boato na cidade corre, inclusive, nos Guarapes hoje, que a dona daquelas terras tinha um problema de crescimento anormal das orelhas. Para se curar, ela comia fígado de crianças. O local do sacrifício era o sobrado velho. Por este motivo, existem superstições em torno do lugar. Alguns não se atrevem a ir lá à noite, com medo do fantasma da viúva. 

Grandes foram as posses de Amélia Machado. A localidade dos Guarapes foi inventariada no espólio do Coronel Juvino Barreto em 1901, partilhada pelo filho Abel Juvino Barreto. Foi vendida a Nizário Gurgel e leiloada em 1909, arrematada pelo Coronel Felinto Manso e adquirida, depois, por João Machado. Este era o marido da viúva Machado. Eles eram proprietários das terras do Pitimbu, Felipe Camarão e Guarapes, além de localidades no interior. A casa da colina era usada pelos proprietários para juntar os funcionários e efetuar o pagamento. 

Bairro grita por segurança, esgoto e pavimentação 

O bairro dos Guarapes é o segundo em área de Natal. Tem 1.280,13 hectares, perde apenas para o bairro Lagoa Azul com seus 1.299,90 hectares. As margens da estrada de Macaíba, conserva-se rural, com granjas e pequenos sítios, com criações de porcos e gado. A principal atividade, entretanto, ainda é a pesca. 

Nos rios Jundiaí e Potengi, os moradores dos Guarapes buscam seu sustento, pescando. Alguns vão ao manancial apenas para pegar tira-gostos, como o sururu. As pescarias com tarrafas, que arrastam os peixes ainda pequenos, contribuiu para a diminuição dos cardumes no local. Em cada parte do rio, estão determinadas espécies. Elas são as mais diversas, como tainha e carrapeta. Já estão difíceis de encontrar o cacetão e a curimã.  

Os mangues também são fonte de sustento para a população. Muitos vivem de pegar crustáceos em meio ao lamaçal. Guarapes tem, no entanto, como principais reivindicações a pavimentação, esgotamento sanitário e segurança. 

RIO JUNDIAÍ - A ocupação desordenada dos Guarapes provocou conseqüências diretas nos mananciais que banham o bairro. O trabalho de especialização do professor aposentado da UFRN, Francisco de Assis de Melo e Silva - Guarapes: Conseqüências Ambientais - mostra o desaparecimento do riacho do ouro e a ameaça que sofre o riacho da prata. Eles são dois sub-afluentes do rio Jundiaí. 

A intenção de acabar com as favelas em outras áreas da cidade fez com que a prefeitura simplesmente permitisse a ocupação no lugar. O bairro surgiu em 1988, mas já estava sendo ocupado em 1983. 

O trabalho sugere uma série de recomendações para controlar a degradação do meio ambiente. A proposta acadêmica prevê acompanhamento técnico nas horticulturas comunitárias, além de controle da criação de animais na área, construção de fossas sumidouros, recuperação e reflorestamento da mata ciliar e um trabalho de educação ambiental no local.

HISTÓRIA DO BAIRRO DO BOM PASTOR

História do Bairro

O Instituto Bom Pastor, fundado em 21 de agosto de 1947. Foi o primeiro prédio construído no bairro. Feito pela Obra Jesus Bom Pastor, foi o que deu origem ao nome do bairro, pertencente, então, às Quintas. O prédio foi entregue às Irmãs de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor de Angers, uma congregação francesa voltada para obras de divulgação das ações e palavra de Jesus Cristo. No Instituto foi construída uma capela em forma de cruz, uma marca das construções feitas pela irmandade. 

O terreno escolhido para o Instituto ficava distante da cidade, numa área de sítios, e sequer havia o cemitério, construído ao lado. A arquidiocese implantou um programa para recuperação de jovens com problemas de conduta. Como havia meninas prostituídas, chegou a ser conhecido a casa das "arrependidas". Havia o projeto de se construir um presídio feminino no local, mas não saiu do papel. 

Lá, foi instalado o primeiro telefone da comunidade, que até a década de 50, sofria com a falta de acesso para automóveis. Os veículos íam até a Avenida Bernardo Vieira. Depois do Instituto, foi construído o Estevão Machado, para meninos. No final dos anos 80, a congregação Servas do Coração Imaculado de Maria, ditas Irmãs do Bom Pastor de Quebec, do Canadá, substituíram as irmãs de Angers, no Instituto. 

O cemitério e o cruzeiro da rua Bom Pastor são pontos tradicionais no bairro. No primeiro estão enterrados personagens famosos da cidade como o ladrão Baracho, cultuado como milagreiro e o cantor Carlos Alexandre. Lá, estão enterrados criminosos que ensangüentaram a crônica policial da cidade, como Naldinho do Mereto e Paulo Queixada, além de Genildo Ferreira, o matador de São Gonçalo do Amarante. 

Construído no início dos anos 60, o cemitério do Bom Pastor I é a maior referência do bairro. Olcupa uma área de 200 metros quadrados. O Bom Pastor II é bem posterior.

HISTÓRIA DO BAIRRO DE FELIPE CAMARÃO

História

O terceiro bairro em população da cidade, Felipe Camarão, é tido como um dos locais mais violentos da cidade. Mas nem tudo é tristeza. A camaradagem dos amigos da parte antiga de Felipe Camarão é exaltada como uma das qualidades do bairro. A Fundação Bradesco é tida como uma das benesses no bairro, por oferecer ensino de qualidade aos garotos da região. 

Peixe-Boi foi a primeira denominação do bairro. Isto porque disseram que foi encontrado um espécime grande deste mamífero nos mangues do local. Mas o nome de batismo do índio Poti, chefe dos potiguares, designa o lugar nos dias de hoje. A localidade passou a se chamar Felipe Camarão, através da lei 1.760 de 22/08/68, publicada no Diário Oficial de 24/08/68. 

Dois conjuntos formam o bairro de Felipe Camarão. O primeiro surgiu nas proximidades do mangue e é tido como o lugar mais calmo. Entretanto, o antigo Pró-Morar, atual Felipe Camarão II, é conhecido como um lugar perigoso, principalmente nas imediações da favela. 

Não é só o temor da violência que os moradores, tanto de Cidade Nova como de Felipe Camarão, dividem. Entre os dois bairros fica a estação do trem, logo adiante o palco de uma tragédia inesquecível para quem conseguiu sobreviver. Ainda mais quando o trecho perigoso, onde os ônibus cortam a linha férrea, continua sem sinalização.
Em 96, no cruzamento das ruas Monte Calvo com a São Sebastião, o ônibus da empresa Conceição colidiu com o trem. Três pessoas morreram e 32 ficaram feridas. 

As vendinhas improvisadas nas residências são o sustento de muitos nos bairros de Felipe Camarão e Cidade Nova. São garagens, salas ou áreas construídas especificamente para virar mercearia que sobressaem no cenário do aglomerado urbano. Para os conhecidos, o velho fiado, ainda é modo de garantir a saída dos produtos. Outro sustento informal vem do lixão de Cidade Nova, os vidros jogados fora, tornam-se ouro quando bem aproveitados.
A realidade da Região Oeste do Natal
Diagnóstico sócio-econômico e ambiental
Natal é uma das capitais da região Nordeste que vem apresentando os maiores índices de crescimento. Entre o ano de 1970 e 2000, a população da cidade cresceu de 264.379 para 709.422 habitantes, segundo o IBGE (2000). Um dos fatores mais importantes neste crescimento, ao lado da atração de investimentos que a região Nordeste experimenta, tem sido o incremento da indústria do turismo.
 

POPULAÇÃO POR SEXO E FAIXA ETÁRIA DOS BAIRROS COMPREENDIDOS NA
ÁREA DE ABRANGÊNCIA DO PROJETO ENGENHOS DE SONHOS
NOS 3 PRIMEIROS ANOS – NATAL, 1996

Faixa Etária

Feminino
Masculino
TOTAL
0 a 9
12.844
13.151
25.995
10 a 14
6.382
6.252
12.634
15 a 19
6.192
5.787
11.979
População de jovens
25.418
25.190
50.608
20 a 24
25.596
5.280
30.876
25 a 34
9.428
8.697
18.125
35 a 44
6.907
6.332
13.239
45 a 64
6.694
5.371
12.065
Acima de 65
2.479
2.023
4.502
TOTAIS
76.522
52.893
129.415
Fonte: IBGE, Contagem Populacional, 1996.

Este processo de desenvolvimento vivido pela cidade tem servido de elemento de atração às populações do interior, fazendo com que cerca de 25% dos habitantes do estado residam na capital.  Esse processo de migração tem promovido uma forte pressão por oferta de serviços públicos, com pouca capacidade de resposta por parte das administrações municipais.

A cidade divide-se em 04 Regiões Administrativas (Norte, Sul, Leste e Oeste), tendo na região Oeste um dos maiores contingentes populacionais, com 183.610 habitantes (IBGE, 1996) e os piores indicadores sociais da cidade. O maior índice de mortalidade infantil (21,42%), o maior índice de gravidez precoce (24,95%) e de incidência de DSTS e AIDS.

Quanto à educação, segundo o IBGE (1996), 29,96% dos chefes de famílias da região são analfabetos e 16,86 % possuem apenas de 1 a 3 anos de estudo.

A região Oeste é também campeã em incidência de homicídios e concentra o maior índice de ações transgressoras cometidas por jovens. Por outro lado, os jovens também são vítimas de diversas formas de violência: abusos sexuais, abandono, consumo de drogas, espancamentos, inclusive de crianças na faixa etária de 0 a 6 anos, trabalho infanto-juvenil, inclusive em atividades ilícitas como o tráfico de drogas, práticas afetivo/sexuais com exposição à gravidez precoce e DSTs/AIDS.

Os jovens da região têm uma enorme carência de espaços positivos e saudáveis destinados ao lazer e outras atividades. Ainda assim muitos deles se reúnem e se organizam em grupos ligados às igrejas católica e evangélicas.  Algumas unidades de saúde da rede municipal possuem grupos de auto-ajuda e autocuidado de adolescentes e jovens. Existem também jovens organizados junto as ONGs que atuam com a juventude: Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, Projeto UNI-Natal, Produrn e a Fundação Fé e Alegria, que trabalham com crianças em idade pré-escolar; um grupo de capoeira, grupos de teatro e boi de reis em Felipe Camarão. Outro ponto de encontro importante é a escola.

Os jovens se encontram ainda nos bares e clubes da região. Alguns se organizam em galeras e gangues nas quais observa-se ações transgressoras, destacando-se o consumo de drogas (álcool, fumo, maconha e crack).

A ocupação e utilização do espaço físico construído e natural apresenta a seguinte conformação:

INFRA-ESTRUTURA E EQUIPAMENTOS URBANOS
DA REGIÃO OESTE – NATAL, 1999
População (IBGE, 1996)
186.591
     
Área
3.418,87 hectares
Drenagem
41,06%
Densidade Demográfica
(SEMURB, 1997)
54,57 hab/ha
Zona de Proteção Ambiental
Área de Mangues
Manguezal
5.786.000m²
Total de Domicílios ocupados (IBGE, 1996)
43.200
Sub Zonas de Proteção
Riacho das Quintas, Riacho do Ouro, Riacho da Prata, Estuário do Potengi, Campo do Mar de Guarapes, Lagoa de São Conrado.
Vilas
1.207
Horto
2
Favelas / população
25 / 20.462 hab
Vazios Urbanos
15.232.950,09m²
Limpeza Pública
Coleta regular 3 vezes por semana
Pavimentação
37,83% das vias urbanas
Fonte: SEMURB, 1996/2000 e IBGE, 2000.

SAÚDE E EDUCAÇÃO NA REGIÃO OESTE – NATAL, 1999
EDUCAÇÃO
 

SAÚDE

Escolas Municipais
20 escolas - 195 salas
Unidades Básica de Saúde
9 – Cidade Nova*, Felipe Camarão*, Guarapes*, Bom Pastor, Monte Líbano, Km6, Novo Horizonte*, Quintas, Guarita, 13 de Maio, Nova Cidade*
Alunos Matriculados
Pré-escola -1.246
1º grau - 14.499
Unidades Mistas de Saúde
2 – Felipe Camarão e Quintas
Escolas Estaduais
28 escolas - 282 salas.
Pronto-Socorro Geral
1 – Cidade da ESperança
Alunos Matriculados
Pré-escola -123
1º grau - 17.844
2º grau - 4.752
Atendimento Psico-social (NAPS/CAPS)
1
Escolas Particulares e Conveniadas
25 escolas - 145 salas
Nº de Servidores
Nível elementar: 265
Nível Médio: 572
Nível Superior: 544
Creches:
13
Unidades de Saúde da Família
5
Unidades com o Programa de Saúde da família
Fonte: SMS-Natal, 2000 e IBGE, 2000.